O evangelista Marcos narra
que Jesus foi para “Sua própria terra”, isto é, para Sua cidade de
origem, a cidade de Sua família: Nazaré. Para Marcos, esta é a última
vez que Ele àquele lugar. É também a última vez que Ele entra numa
sinagoga, lugar onde os judeus se reuniam aos sábados para ouvir a
Palavra de Deus e rezar. No início, quem se admira são os ouvintes.
Porém, a admiração não os leva à fé em Jesus, mas sim a rejeitá-lo. No
final desse Evangelho, é Jesus quem se admira com a falta de fé daquele
povo. Essa falta de fé no Homem-Jesus impede a realização de milagres,
isto é, o Reino acaba não acontecendo em Nazaré.
Marcos dá a entender que o povo estava
cansado com esse costume. De fato, quando o Senhor entra, pela primeira
vez, numa sinagoga e começa a ensinar (cf. 1,21-28), o povo gosta desse
novo ensinamento dado com autoridade (cf. 1,27).
Em Nazaré, terra de Jesus, as coisas
tomaram um rumo diferente. É que Ele não havia frequentado nenhuma
escola de ensino das Escrituras, não fez nenhuma especialização. Além
disso, Seu ensinamento é acompanhado de uma prática que livra as pessoas
de qualquer tipo de opressão. Marcos não consegue mostrá-Lo ensinando
sem que antes Ele desse a verdadeira liberdade ao homem. Mais ainda: Seu
ensinamento é uma prática de autêntica liberdade.
Em Nazaré, num dia de sábado, Jesus está
ensinando na sinagoga. Mais uma vez o evangelista não diz o que Jesus
ensina. Nós não precisamos de explicações, pois conhecemos que tipo de
ensinamento é o d’Ele.
O povo que está na sinagoga manifesta sua
perplexidade e descrédito em relação a Jesus. A primeira e a segunda
levantam suspeita e ceticismo: “De onde ele recebeu tudo isto? Como conseguiu tanta sabedoria?”
Por trás dessas objeções está o início da rejeição de Jesus como
Messias. Naquele tempo, especulavam muito sobre a origem do Messias. E a
conclusão a que chegaram era esta: “Nós sabemos de onde vem esse Jesus, mas, quando chegar o Messias, ninguém saberá de onde ele vem”
(Jo 7,27). Jesus, portanto, não poderia ser o Messias, pois sua origem
era conhecida por todos. Além disso, para os conterrâneos de Cristo é
impossível “fazer teologia” sem passar pela escola dos doutores da Lei e
fariseus.
A terceira pergunta levanta suspeitas sobre quem age por meio de Jesus: “E esses grandes milagres que são realizados por suas mãos?” Um
pouco antes, alguns doutores da Lei afirmavam que o chefe dos demônios
agia em Jesus, levando-O a expulsar demônios. O povo de Nazaré deixa
transparecer essa mentalidade.
A última pergunta sintetiza todas as anteriores: “Esse
homem não é o carpinteiro, o filho de Maria e irmão de Tiago, de José,
de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco?” É uma
pergunta desmoralizante e debochada. Quando se queria desprezar alguém,
bastava substituir o nome do pai pelo da mãe. Por isso, a expressão
“filho de Maria” (a não ser que José já tivesse morrido) é altamente
depreciativa. E a conclusão é muito simples: “Ficaram escandalizados por causa dele”, isto é, seus conterrâneos O rejeitaram.
Jesus, portanto, foi rejeitado, porque se
apresentou como um trabalhador que cresceu em Nazaré ao lado de
parentes, amigos e conhecidos. Seus conterrâneos não descobriram n’Ele
nada de extraordinário que pudesse indicá-Lo como o Messias de Deus, mas
a extraordinariedade de Jesus-Messias está justamente aí, na
Encarnação, no fato de não ter nada que possa diferir da condição humana
comum. O Filho de Deus se fez como qualquer um de nós, e aqui está o
“nó da questão”. Muitos afirmam que “não creem, porque não veem”. Os
conterrâneos de Jesus não creem, justamente porque veem Jesus
trabalhador, o filho de Maria, um homem do povo, que não frequentou
nenhuma escola superior, um homem que vem de Nazaré, lugarejo
insignificante.
O “escândalo” da Encarnação continua
sendo um espinho atravessado na garganta de muito cristão de boa
vontade. Por se encarnar nas realidades humanas, Jesus-Messias foi
rejeitado. Isso faz pensar no desafio que é a encarnação do Evangelho na
realidade do povo. Ficaremos paralisados como os conterrâneos de Jesus?
Pai, abra minha mente e meu coração para
eu compreender que o Senhor se serve de meios humanamente modestos para
realizar as suas maravilhas.
Padre Bantu Mendonça- Canção Nova
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