Padre Geovane Saraiva*
Quando os três magos do oriente, guiados pela estrela, caminharam ao encontro do Menino Jesus, mostrando ao mundo que a vida das pessoas é uma caminhada, e que na misteriosa e inaudita manifestação, somos chamados a fazer a mesma coisa. “Aquele menino, nascido em Belém da Virgem Maria veio para libertar não só o povo de Israel, que foi representado pelos pastores, mas também para a humanidade, representada pelos Magos vindos do Oriente”, disse o Papa Francisco aos 06.01.2015, na festa da Epifania do Senhor. Eles andaram, caminharam, deixaram claro que a Igreja é dinâmica e que está a caminho. O Sumo Pontífice fala de uma “Igreja em saída, que Deus quer provocar os crentes; que Abraão aceitou o chamado para partir rumo a uma nova terra”. Disse ainda mais, que “a Igreja em saída é uma Igreja de portas abertas. Sair na direção do outro aos outros para chegar às periferias humanas não significa correr pelo mundo sem direção nem sentido” (cf. EG 19, 46).
Compreendemos perfeitamente o rigor e a lógica do Papa Francisco, quando fala de uma Igreja em saída, na surpreendente antecipação de nomear os 15 novos cardeais, em 04.01.2015, com menos de 80 anos, de países que incluem Tonga, Nova Zelândia, Cabo Verde e Birmânia, para nos fazer pensar na diversidade de dons e carismas dentro de uma Igreja que sai e, ao mesmo tempo, quer valorizar seu crescimento em regiões de missão, tais como Ásia, África e Oceania. Como nosso coração vibrou ao falar da janela do Vaticano à uma multidão na Praça de São Pedro, para anunciar essa boa e surpreendente notícia! Palavras de Miguel Ângelo, um jovem cabo-verdiano que mora em Fortaleza, na nossa paróquia Santo Afonso, e encontra-se em fase de conclusão de seu doutorado sobre o meio ambiente na UFC: “É isso aí Padre Geovane Saraiva, nosso Papa Francisco nos enche de alegria; a comunidade católica dos países lusófonos está de parabéns! Quem diria um país tão pequeno, de cerca de 500 mil habitantes, sendo 98% católicos, com voto útil no colégio cardinalício?” Conforme a assessoria do Vaticano acrescentou ainda, que nos dias 12 e 13 de fevereiro, vai liderar um encontro com todos os cardeais para “refletir sobre as orientações e propostas para a reforma da Cúria Romana”, organismo administrativo da Igreja Católica.
Apesar de suas inúmeras realizações, como é imprescindível olhar para um Francisco consequente à frente da Igreja, também nas suas sábias e proféticas palavras, as quais penetram no coração do mundo como um clamor e grito. Mesmo quando é criticado, porque não tem medo de dizer: “Quem doa à Igreja e rouba o estado é falso cristão, porque anuncia a deusa da corrupção”. A profecia do Bispo de Roma nem sempre agrada e é bem acolhida, surgindo um ambiente a corroborar no sentido de hostilizá-lo. Diversos são os comentários a respeito de um clima hostil e desfavorável ao Santo Padre, marcado por críticas pesadas, articuladas e crescentes em diversos lugares do mundo, mas principalmente dentro da Igreja, na Itália, entre os cardeais. Vejo aqui a presença clara do querido Francisco diante do Evangelho da cruz, da paixão: “Eu vim trazer fogo à terra, e como desejaria que já estivesse acesso. Devo pregar um batismo, e como me angustia até que esteja consumado!” (cf. Lc 12, 49-50).
O pedido de perdão por suas faltas e de seus colaboradores e mesmo sobre as quinze “enfermidades” da Cúria Romana, penso que está bem dentro do desejo do Santo Padre, de que se faça a experiência do Evangelho lá na Cúria, segundo o questionamento de Franco Monaco, jornalista e ex-presidente da Ação Católica de Milão, “O Evangelho também não é ‘sinal de contradição’, ‘espada de dois gumes’ ‘escândalo e loucura’?”, na palavra de Deus que é clara: “Não pensem que vim trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada” (cf. Mt 10, 34). Insatisfações fortíssimas que se personificam no escritor Vittorio Messori no Corriere della Sera de Milão, com o título: ”As opções de Francisco: dúvidas sobre a virada do Papa Francisco” (24/12-2014). Podemos compreender, à luz da fé, um papa consequente porque desafia a montanha milenar que não quer abraçar o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo na sua plenitude. Daí as diversas palavras impiedosas, usadas para atacar o Santo Padre, aproveitando-se do momento auspicioso da véspera do Natal para atingi-lo.
Percebe-se que o bendito plano de reforma da Igreja, sem esquecer suas fortes críticas à economia de exclusão, e o comodismo de alguns padres e agentes evangelizadores da Igreja ganhou espírito hostil. Sobre a “economia de exclusão”, segundo o papa argentino, “assim como o mandamento de ‘não matar’ coloca um limite claro para garantir o valor da vida humana, hoje temos de dizer ‘não a uma economia de exclusão e desigualdade’. Essa economia mata. (…) Hoje, tudo está dentro do jogo e da competitividade, onde o forte devora o fraco. Como resultado, grandes massas da população são excluídas e marginalizadas: sem emprego, sem horizontes”. Para Francisco, os “excluídos não são explorados, mas resíduos, excedentes”.
Todavia o Augusto Pontífice não se cansa jamais e tendo por base uma mística e caridade pastoral a sensibilizar e comover corações, repleta da mais profunda esperança, Francisco agora vai partir para sua sétima viagem internacional, com destino ao Sri Lanka e Filipinas nos dias 13-19.01.2015, querendo ser um farol a iluminar os caminhos da história daqueles povos asiáticos, oferecendo-lhes, dentro de um clima, no qual favoreça a compreensão cultural e espiritual, em um clima revestido da ternura franciscana, com profundo respeito pela realidade ecológica e ambiental, na qualidade de pastor universal, vai se encontrar com as vítimas do devastador (tsunami) desastre ecológico de 2004, que além de causar milhares de mortes, deixou uma triste e maldita herança de aproximadamente cinco milhões de criaturas humanas desabrigadas. Quão preciosa e de inigualável importância é a visita do Sumo Pontífice àqueles povos! Compreendo-a como já sendo o prólogo de sua nova Encíclica sobre a realidade supracitada do planeta, no seu ecossistema comprometido, nos gemidos da criação como em dores de um parto (cf. Rm 8, 22), que ansiosamente a aguardamos!
*Escritor, blogueiro, colunista, vice-presidente da Previdência Sacerdotal e Pároco de Santo Afonso, Parquelândia, Fortaleza-CE – geovanesaraiva@gmail.com