Depois de Jesus ter falado com aquele jovem rico – um estudioso da
Lei, que cumpria todos os parágrafos, não era desonesto, nem mentiroso,
nem violento e adúltero -, Ele agora nos propõe este texto que fala
sobre o perigo das riquezas.
Vendo aquele jovem, Jesus acha-o não distante do Reino dos Céus. Por
isso, faz-lhe um convite a vender tudo e destribuí-lo aos pobres: “Se
você quer ser perfeito, vá, venda tudo o que tem, e dê o dinheiro aos
pobres, e assim você terá riquezas no Céu. Depois venha e me siga”. Porém, o conceito que aquele homem tinha de “riqueza” divergia do conceito do Mestre.
Para Cristo a Lei é o varal da fraternidade, é resposta à Aliança
gratuita e generosa oferecida por Deus. É partilha, é comunhão. Assim,
se os bens não forem entendidos como dons que devem ser partilhados com
os pobres não teremos direito a herdar o Reino dos Céus.
Ao jovem, que já era fiel observante dos mandamentos, Jesus faz uma
proposta radical: vender tudo, distribuir o dinheiro aos pobres e
segui-Lo. O jovem se retirou triste, porque era muito rico. Não teve
coragem para desvencilhar-se de tudo, tornar-se discípulo e aderir ao
compromisso de construir o Reino. E Jesus adverte sobre o perigo que a
riqueza pode significar para a liberdade e o desenvolvimento pleno da
pessoa.
O Eclesiástico lembra que ela pode se tornar um forte obstáculo para a
integridade (cf. Eclo 32,1-11). Certamente, a palavra de Jesus: “Em
verdade vos digo, dificilmente um rico entrará no Reino dos Céus. E
digo ainda: é mais fácil um camelo entrar pelo buraco de uma agulha, do
que um rico entrar no Reino de Deus” (Mt 19,23-24), além de alertar
para o risco que corre o rico em ordem à sua salvação, alude à
dificuldade para um seu engajamento mais pleno na construção do Reino,
que é vida para todos, no aqui e no agora de nossa existência.
Veja que Jesus, no Evangelho de hoje, nos indica uma dificuldade
real, uma necessidade de esforço penoso e não uma impossibilidade.
Os Padres da Igreja – dos primeiros séculos pós-catacumba – explicam
que a razão da dificuldade tem a ver com minha relação com Deus, comigo
mesmo e com os outros. O que entendem por “rico” e “riqueza” não é
quantidade absoluta de bens, mas situação na sociedade. Quem tem 10% dos
bodes da tribo de criadores primitivos, é rico; não importa se dispõe
de menos bens do que hoje vemos.
Riqueza é condição material concreta adequada ao poder. Mas como o
poder em si mesmo, ela em si não é má. O Senhor não condena nem os ricos
nem as riquezas; mas adverte os seus discípulos do perigo que correm,
se lhes entregarem o coração. Em contrapartida, a atitude desprendida de
Pedro e dos outros apóstolos é caminho certo para entrar no Reino de
Deus. O mundo novo que o Filho de Deus nos revelou na sua morte e
ressurreição inaugurou a regeneração do universo, em que tudo é julgado
por outros critérios.
A graça de Deus pode fazer gente rica ser profundamente cristã. Temos
como alguns exemplos: Henrique II (imperador da Alemanha), Luis IX (rei
da França), Isabel (rainha de Portugal) e a duquesa Edviges, cujo fundo
rotativo de ajuda ao camponês encalacrado a fez “Padroeira de todos os
endividados”.
Mas ser rico é um risco. Risco em nossa relação com Deus, exposta a
duas variantes da mesma tentação: o ateísmo prático e a idolatria.
A riqueza ameaça minha relação comigo. Os bens são nossos servos,
para nossa vida e vida plena, nossa e de todos ao nosso redor, para
nossa realização como pessoas, também diante de Deus. No momento em que
eles não mais nos servem, mas nós servimos a eles, começa o desvio.
A riqueza me separa dos outros, afasta-me deles. Os bens deste mundo
em si são bons, presentes carinhosos do Deus que quer que todos os seres
humanos tenham vida e vida plena.
Que a verdade proferida por Jesus me ensine a ter um coração mais
desapegado dos bens terrenos e mais rico da presença de Deus. Pois o
desapego dos bens terrenos é um caminho de sincera humildade e confiança
em Deus.
Padre Bantu Mendonça- Canção Nova
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