Congresso teológico celebrou os 20
anos da publicação do Novo Catecismo da Igreja e marcou a preparação
imediata para o início do Ano da Fé. O evento foi realizado nas
instações da PUC de Curitiba (PR) e contou com a participação, na
abertura, do cardeal dom Raymundo Damasceno Assis, arcebispo de
Aparecida (SP) e presidente da CNBB.
Reproduzimos aqui, com autorização do autor, matéria com a síntese da cobertura do evento.
A Igreja no Brasil acaba de dar uma
espécie de pontapé inicial para as celebrações do Ano da Fé e dos 20
anos do Catecismo da Igreja Católica (CIC). A CNBB promoveu um congresso
teológico nacional sobre os temas e reuniu mais de 200 participantes. O
encontro aconteceu na Pontifícia Universidade Católica (PUC) – campus
Curitiba (PR) –, entre os dias 7 e 9 de setembro.
O quadro de conferencistas contou com
especialistas do cenário teológico brasileiro e também com a presença do
secretário da Congregação para a Doutrina da Fé do Vaticano, dom Luis
Francisco Ladaria Ferrer. A articulação foi realizada por meio de três
comissões episcopais da CNBB: Doutrina da Fé, Animação
Bíblico-Catequética e Educação e Cultura.
“O Catecismo é um dos documentos
insubstituíveis para o processo de catequese, um precioso dom para a
Igreja. É um referencial seguro para a formação e aprofundamento da fé
hoje e um dos grandes frutos do Concílio Vaticano II”, ressaltou o
presidente da CNBB e arcebispo de Aparecida (SP), cardeal dom Raymundo
Damasceno Assis, na abertura do evento.
“A própria construção do congresso foi
pedagógica. A união das três comissões tem uma dimensão eclesial e
comunitária muito clara: o catecismo e o Ano da Fé não podem ser
abraçados de maneira isolada”, assegura o presidente da comissão para a
Doutrina da Fé e arcebispo de Brasília (DF), dom Sérgio da Rocha.
A partir das temáticas refletidas, cada
comissão deve tirar conclusões específicas para o trabalho que
desempenha. “Mas já a experiência de fazer junto foi muito importante.
Precisamos somar forças para que a educação da fé seja mais concreta e
efetiva. Não temos doutrina da fé – conteúdo – sem a educação da fé –
catequese, metodologia. E tudo isso precisa levar em conta o contexto
dos interlocutores – cultura. Daí o porquê dessa grande união”, explica o
presidente da comissão para a Animação Bíblico-Catequética, dom Jacinto
Bergmann.
Reflexos
A organização espera que o congresso
tenha reflexos concretos na vida da Igreja no país. O principal deve ser
a acolhida renovada do CIC, que já deveria ter sido mais conhecido,
divulgado e vivido ao longo desses 20 anos, segundo a avaliação de dom
Sérgio da Rocha. O Ano da Fé, que inicia no dia 11 de outubro, torna-se
ocasião privilegiada para isso.
Várias temáticas do congresso também
reforçaram o aspecto da catequese e de iniciação à vida cristã. Se a
catequese é a educação da fé, o CIC é o instrumento que ajuda a
concretizar esse processo. “O congresso reforça a concepção de catequese
catecumenal e o grande instrumento que é o catecismo. Isso significa
dar importância à iniciação das pessoas no seguimento de Jesus, a
levá-las a um encontro com o Senhor”, ressalta dom Jacinto.
Um ponto que recebeu especial atenção
diz respeito à linguagem do CIC, que seria um agente dificultador para
que ele possa chegar às bases das comunidades eclesiais. Uma saída
pastoral viável é a produção de subsídios e materiais de apoio que
ofereçam o conteúdo por meio de uma linguagem mais palatável.
“A Igreja no Brasil sempre produziu
muitos subsídios inspirados no CIC. O congresso reforçou a ideia de
fazermos materiais que facilitem o acesso ao catecismo, que apresenta o
conteúdo da fé e nos inspira como a vida pode ser consequência do crer
em Deus”, reforça dom Jacinto.
O bispo revela que a comissão que
preside na CNBB está em processo de elaboração de roteiros que orientem o
processo de iniciação à vida cristã, inspirados no CIC.
Programação
O congresso contou com conferências gerais na parte da manhã e com quatro grupos temáticos nas sessões da tarde.
As conferências gerais proferidas por
dom Luis Ladaria abordaram as seguintes temáticas: Catecismo da Igreja
Católica: gênese, estrutura e perspectivas; Ano da Fé: a fé aberta a
todos; Considerações finais sobre o encontro e perspectivas.
O congresso também contou com dois
renomados teólogos brasileiros como conferencistas gerais. O padre Mário
de França Miranda falou sobre A dimensão individual e eclesial da fé
cristã, enquanto frei Carlos Josaphat proferiu o tema Estrutura do
Catecismo da Igreja Católica e a vida cristã.
Já os grupos temáticos tiveram os
seguintes focos: Fontes do CIC; Temas teológicos transversais no CIC;
Catequese e CIC; Fé no CIC. No total, os grupos foram assessorados por
15 especialistas das mais diversas áreas.
Conferências de dom Luis Ladaria
Em sua primeira conferência, no dia 7, o
secretário da Congregação para a Doutrina da Fé do Vaticano, dom Luis
Francisco Ladaria Ferrer, ressaltou que a essência da atual estrutura do
CIC – Profissão de fé, Celebração do mistério cristão, Vida em Cristo e
Oração cristã – já está presente nas obras catequéticas dos Santos
Padres (grandes homens da Igreja, aproximadamente do século II ao século
VII, que firmaram os conceitos fundamentais da fé cristã e são os
responsáveis pelo que se chama hoje de Tradição da Igreja). Essa
estrutura se manteve constante até hoje.
Logo após, o arcebispo apresentou um
histórico dos catecismos anteriores, com ênfase para o primeiro de que
se tem notícia e que foi escrito na língua portuguesa, o de Celta
(1505), bem como o Romano (1566), fruto do Concílio de Trento. Os
escritos eram inicialmente destinados aos párocos, a quem cabia a
tradução do conteúdo para os fiéis.
Dom Ladaria ressaltou que o CIC não é um
fruto direto do Concílio Vaticano II, mas está em íntima relação com
ele. De fato, o Concílio apenas solicitou a elaboração de um diretório
que orientasse a elaboração dos catecismos nacionais, o que aconteceu em
1971.
Contudo, nos anos pós-conciliares,
apareceram catecismos em diversos países. Alguns problemas de fidelidade
à Tradição e ao Magistério, como aconteceu no caso holandês, fez
ressurgir o desejo de que houvesse um documento oficial para toda a
Igreja. Isso foi concretizado ao final da Assembleia do Sínodo dos
Bispos de 1985, que celebrou os 20 anos de encerramento do Vaticano II e
fez a solicitação ao Papa.
O CIC foi escrito originalmente em
francês e lançado em 1992. Contudo, a edição típica surgiu apenas em
1995, e é a essa que se deve reportar, pois conta com reformulações em
diversos pontos, após manifestação das conferências de todo o mundo. Dom
Ladaria indicou que houve 24.000 sugestões de emendas, retoques e
modificações.
Ao finalizar sua apresentação, o
arcebispo recordou a importância do Compêndio do CIC, por sua brevidade,
clareza e integridade, e também por tornar possível que as comunidades
conheçam as verdades reveladas e transmitidas pela Igreja.
Segunda conferência geral
No dia 8, dom Ladaria falou sobre o Ano
da Fé. Ele destacou a “situação dramática” de secularização em muitos
países da Europa, mas que também afeta o continente americano. A
eliminação da transcendência do horizonte de vida das pessoas traz como
conseqüência graves problemas pessoais e sociais.
O Papa Bento XVI já falou diversas vezes
de analfabetismo religioso. Nesse sentido, o Ano da Fé tem o objetivo
de dar um impulso renovado a toda a Igreja, para que os homens que se
encontram afastados possam chegar à amizade com Cristo, que dá vida em
plenitude.
“Fé é, antes de tudo, adesão pessoal do
homem a Deus. Ao mesmo tempo, é assentimento livre a toda a verdade que
Deus revelou. São dois pontos fundamentais”, disse.
Os pontos cardeais do Ano da Fé devem ser a fé confessada, celebrada e testemunhada.
Conferência de frei Carlos Josaphat
O frei dominicano e doutor em teologia
moral, Carlos Josaphat Pinto de Oliveira, proferiu a segunda conferência
geral do dia 7. Ele ressaltou que a estrutura do CIC está em plena
fidelidade à Revelação de Deus e se reporta a dois concílios
eclesiológicos, o de Trento e o Vaticano II. De certa forma, o CIC torna
operacional a mensagem desses dois concílios, voltados para a reforma e
renovação do corpo eclesial.
Frei Josaphat ressaltou a dimensão
colegial do trabalho que foi realizado para a escrita do CIC. Ao
solicitarem a elaboração do CIC, os bispos reunidos no Sínodo de 1985
apontavam para a oportunidade de se comprovar os fundamentos bíblicos e
patrísticos do Concílio Vaticano II. “Esse dado é da maior evidência e é
muito oportuna a temática desse encontro. O CIC recolhe e concilia o
que há de melhor no antigo e no novo.”
Houve todo um esforço para reelaborar de
maneira viva o objetivo do Vaticano II. O CIC coincide com uma
estrutura que visa primordialmente os párocos – o que levaria à pregação
e constituição de catecismos locais.
“O catecismo atual mostra como o
Vaticano II perpetua o essencial dos concílios anteriores e os
enriquece. O CIC procura enfrentar o desafio lançado hoje à vida cristã.
A escolha e ajustamento dos quatro pilares seguem a opção dos relatores
de Trento e o consideram como quadro doutrinal, introduzindo a
totalidade das orientações sob o ponto de vista da fé e prática da fé.”
O CIC propõe a vida cristã de maneira
integral e ordenada, de tal forma que os fiéis sejam missionários de
amor e santidade para um mundo complexo.
Conferência de padre Mário de França Miranda
O doutor em teologia sistemática, padre
Mário de França Miranda, enfatizou que as transformações sociais
dificultam a fé do cristão e sua relação com a Igreja. Enquanto no
passado havia um tecido cultural unitário predominantemente cristão, a
atual sociedade plural dificulta sobremaneira o acolhimento e a
proclamação salvífica do Evangelho.
A fé cristã é sempre a mesma, mas
apresenta compreensões e vivências diversas ao longo da história. Hoje, o
cristão experimenta mais a fé como resultado de uma opção livre, de tal
forma que interpreta e vive sua existência de modo singular. “A opção
cristã é mais consciente e real, e menos uma fé institucionalizada, de
certo modo passivamente professada”, avalia o sacerdote.
Além disso, costuma-se ouvir que a fé é
dom de Deus, mas, na prática pastoral, esse aspecto não seria
devidamente valorizado. Uma vez que a ação do Espírito Santo é sempre
universal, deve-se anunciar a partir das dificuldades e realidades
vividas por aqueles que estão a nossa volta.
“O modo de expressar o que cremos é tão
importante quanto afirmar como cremos. É preciso anunciar a dimensão
vivencial da fé aos nossos contemporâneos. A transmissão da fé consiste
em transmitir o próprio Deus vivo comunicando-se conosco e, para isso, é
preciso de uma aproximação das realidades vividas pela sociedade hoje.”
A multiplicidade de situações e
contextos vitais obriga os cristãos a viver a fé em meio a novos
desafios, o que exige novas linguagens e práticas. “Nesse sentido, as
experiências podem representar uma contribuição importante para o
magistério eclesiástico e a teologia. A fé do laicato tem algo a dizer à
compreensão mais ampla de fé cristã”, assevera.
De acordo com padre Mário, o centro
verdadeiro da Igreja não coincide com o centro de governo e
administração. “Devemos corrigir a nossa maneira de olhar a Igreja. A
luta pela renovação institucional da Igreja é uma tarefa que compete a
cada um de nós. A fé cristã está desafiada pela sociedade, e isso se
torna possibilidade para vivê-la com maior autenticidade. A fé eclesial
pede a participação ativa em traduzi-la e vivê-la no atual contexto
sociocultural. A fé na Igreja nos capacita a olhá-la em sua verdade e,
assim, amá-la.”
A matéria e as fotos são do repórter/editor Leonardo Meira e foram publicadas pelo Jornal de Aparecida.
Da página da CNBB
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