domingo, 27 de setembro de 2015

Os novos e antigos rostos da imigração no Brasil

A imigração no Brasil diminuiu entre o século XIX e meados do XX. Mas, entre as décadas de 1980 e 1990 o país viveu o auge da emigração. Hoje o um país é um trânsito entre idas e vindas de brasileiros para outros países. Também tem recebido imigrantes de países africanos, asiáticos e caribenhos que se configuram em novos e velhos rostos no Brasil.
No dia 21 de abril de 1500, Pedro Alvas Cabral chegou ao novo território que, mais tarde, ficou conhecido por Brasil. Esse território era habitado por indígenas milenares. Os colonizadores portugueses se fizeram donos das terras e as dividiram em capitanias hereditárias. Trouxeram africanos de modo forçado como escravos para gerar sustento e renda aos proprietários das capitanias.

A Coroa Portuguesa, pela Carta Régia de 9 de agosto de 1747, eliminou as Capitanias Hereditárias, passando a posse das terras para sua jurisdição, dando início à imigração de açorianos, sobretudo, para a regiões de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Com a vinda da Coroa Portuguesa para o Brasil em 1808, o país passou a acolher imigrantes de diferentes nacionalidades. Chegaram ingleses, suíços, franceses, poloneses, russos-ucranianos, turcos, libaneses, austríacos e lituanos. Também vieram os chineses e alemães. Inicialmente os alemães se instalaram na Bahia. Mas a partir de 1827 houve progressiva migração para o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. De 1835 os italianos marcaram presença no Sul do país, bem como em São Paulo.

Periodização da imigração
A entrada imigratória para o Brasil de 1870 a 1959 passou a ser constante. Durante esse tempo o rosto da imigração foi europeia: italianos, alemães, portugueses, espanhóis, poloneses, russos e holandeses. Também vieram imigrantes asiáticos: japoneses, sírio-turco-libaneses e chineses.

As principais razões para essa imigração foram:
- A Revolução Industrial do século XIX que exigia mão de obra qualificada e gerou dificuldade aos artesãos e agricultura familiar. As novas máquinas agrícolas expulsaram milhares de camponeses europeus para outros países;
- O avanço da medicina possibilitou qualidade de vida e crescimento populacional;
- O processo de constituição da Alemanha e Itália pela unificação territorial trouxe desequilíbrios na administração, impostos para o governo e novas classes de funcionários públicos;
- As frequentes guerras entre oriente e ocidente é outro fator que colaborou com a imigração. As duas guerras mundiais e os conflitos no Oriente Médio fomentaram a saída de grande número de população dos países envolvidos.

O Brasil nesse período era atrativo para os imigrantes por dois motivos: substituição da mão de obra escrava nos cafezais e canaviais da região Sudeste e a continuação da colonização pelo desmatamento em fronteiras agrícolas do Sul.

No final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o Brasil buscava mão de obra qualificada devido ao investimento do capitalismo urbano e as novas leis trabalhistas (1932) regulamentadas pelo presidente Getúlio Vargas. Após Segunda Guerra Mundial (1939-1945) a indústria automobilística, química, farmacêutica, siderúrgica e transporte cresceram no Brasil e faltava qualificação de trabalhadores. Houve também flexibilização das políticas migratórias implantadas pelo regime de cotas em 1934 e reforçada pela Constituição de 1937, para acolher refugiados e deslocados do conflito mundial.

De 1960 a 1999 o fluxo imigratório de europeus e asiáticos diminuiu no Brasil, mas cresceu a dos uruguaios, argentinos, chilenos, paraguaios, peruanos, bolivianos, equatorianos, coreanos, angolanos, moçambicanos e egípcios.
Entre os motivos da imigração encontram-se a luta entre as ideologias comunista e capitalista (Rússia e Estados Unidos), pois muitos não concordavam com o sistema imposto. A Guerra na Coreia (1950-1953) provocou divisões e deslocamento populacional. As ditaduras militares e perseguições nos países latino-americanos e o processo de independência das colônias no continente africano.

As razões de acolhimento de imigrantes pelo Brasil se deram pela necessidade de mão de obra qualificada no desejo de crescimento econômico. Por uma opção de destino para fugir de ditaduras de países latino-americanos. Na pós-ditadura militar o Brasil iniciou políticas de Acordos de Cooperação bilaterais e multilaterais com países africanos, sobretudo, com os de língua portuguesa. Com isso muitos estudantes vieram ao Brasil através de programas universitários.

Rostos da imigração hoje
Em pleno século XXI a imigração no Brasil continua crescendo com rostos europeus e latino-americanos conhecidos.
Os europeus vieram ao Brasil afetados pela crise financeira do capitalismo especulativo norte-americano, o que provocou desemprego, estagnação econômica, descontrole financeiro e aumento da dívida externa. Os latino-americanos foram motivados pelo lento crescimento econômico, a precária modernização da infraestrutura, delicada distribuição de renda, desastres naturais e impacto negativo do narcotráfico.

Muitos países africanos em conflitos tribais interno
s e a violação dos direitos humanos. Presença da exploração de transnacionais europeias, chinesas e norte-americanas que se apossaram da riqueza nacional, corrupção política e desastres naturais motivaram milhares para outros países.
Já para países da região caribenha entre as razões da imigração encontram-se os desequilíbrios econômicos e sociais, domínio de ditaduras, desastres ambientais e conflitos internos.
No final da década de 1980 o Brasil entrou em vigor o Estatuto Autoritário do Estrangeiro (Lei 6.815/80) clareou a postura de acolhimento de migrantes, refugiados e deslocados. Com a Constituição Federal de 1988 o destaque em relação aos estrangeiros é baseado nos direitos humanos.
A partir de 1994 o Brasil aderiu a Declaração de Cartagena, comprometendo-se a realizar alterações constitucionais para incorporar princípios das Convenções, Protocolos e Estatuto dos Refugiados. Essa adesão se deu com a Lei 9.474/97 que reforça o direito de qualquer cidadão estrangeiro solicitante de refugiado receber um Protocolo para fazer Carteira de Trabalho, CPF, abertura de conta bancária, ingresso no mercado de trabalho e circular livremente até sua avaliação pelo Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE).

O recente crescimento da economia brasileira, a valorização do salário mínimo, a transferência de renda para a população carente, grandes obras de infraestrutura e a carência de mão de obra qualificada são os fatores de atração de migrantes.
Os Acordos de Cooperação relacionados à imigração com países da África (2003), Haiti (2004), MERCOSUL (2010) e atualmente a União das Nações Sul-Americanas são fatores de atração para o Brasil.
Outro fator determinante é a crescente imagem positiva do Brasil no cenário mundial. Com isso empresas brasileiras despertam em investimentos em todos os continentes. Outros dados que podem ser considerados positivos são os grandes eventos sediados recentemente pelo Brasil, como, por exemplo, a Jornada Mundial da Juventude e a Copa do Mundo, bem com as Olimpíadas preparadas para 2016.

Recentemente imigraram para o Brasil haitianos, senegaleses, ganeses, bengaleses, dominicanos, angolanos, nigerianos, guineenses, marroquinos e somalis. Conforme dados do SINCRE/MJ de 2006 até hoje são mais de 700 mil imigrantes no Brasil.
No Rio Grande do Sul grande demanda migratória foi trabalhar na indústria de alimentos, sobretudo, em frigoríficos. Para Geraldo Iglesias, da União Internacional de Trabalhadores na Indústria de Alimentos e Agricultura (UITA), “a absorção de mão de obra-de-obra de novos rostos de imigrante que chegam ao Brasil tem sido absorvida pelos frigoríficos devido a elevada desistência de trabalhadores e trabalhadoras nacionais que consideram essa atividade “massacrante” e “penosa”.

Acolhimento em Porto Alegre
Pierre Richard Aine, 36 anos, haitiano conta a sua história. “Cheguei a Porto Alegre em maio de 2014 e em julho do mesmo ano consegui visto de Permanência no Brasil até 2019. Deixei minha esposa no Haiti e dois filhos. Já faz um ano que estou empregado num shopping como auxiliar de cozinha. Através da acolhida dos padres Scalabrinianos da Paróquia Pompéia, do Centro de Porto Alegre tive ajuda na documentação e indicação para o trabalho. Estou recebendo aulas de português”. (Foto acima)

Sainronise Geste, 42 anos, haitiana (foto) declarou. “Faz um mês que cheguei a Porto Alegre. Ainda não consegui documentação e nem trabalho, mas encontrei apoio com os padres Scalabrinianos da Pompéia. Deixei meu esposo e nove filhos em meu país Haiti e procuro trabalho. Vim para ajudar meus filhos. Ainda preciso muito aprender português”.

Luisa Rossana Zevallos, 40 anos, peruana relatou. “Já faz dez anos que estou no Brasil. Gostei e fiquei por seis anos ilegal, mas agora estou regularizada. Trabalhei por muito tempo sem carteira assinada, mas todos os empregadores cumpriram com todos os direitos. Fui muito querida e acolhida pelas pessoas que me ofereceram trabalho e mantenho muitas amizades. Outra coisa importante para mim é a Paróquia da Pompéia que a considero como minha segunda casa. Através dos padres recebi direcionamento para minha Permanência no Brasil e trabalho. Sinto na paróquia uma verdadeira acolhida humana. Sou formada em Serviço Social, mas o Ministério da Educação e Cultura (MEC) não reconhece meu diploma. Por isso não exerço minha profissão. Já trabalhei em restaurante e pastelaria. É muito desfavorável ter curso e não ser reconhecido. Penso que o MEC deveria ter mais consideração com essa realidade dos imigrantes formados. Outro elemento que penso ser possível com o tempo é as empresas priorizarem a contratação de imigrantes profissionais como meu caso. Contratar estrangeiro para enriquecer a partilha de conhecimento e cultura”.

Padre João Marcos Cimadon, scalabriniano, natural de Campos Novos (SC), coordenador da Pastoral da Mobilidade Humana do Regional Sul 3, contou sua experiência junto aos imigrantes. “Sinto-me feliz e realizado ao prestar este serviço de acolhida a estes nossos irmãos. Oferecemos nossa acolhida independente da nacionalidade e da religião. O importante é acolher o ser humano com dignidade e alegria para que possa sentir do CIBAI Migrações, da Igreja, da Pastoral a casa deles. Dar-lhes um apoio e segurança neste momento da vida sofrida e difícil. Oferecemos além da acolhida, apoio na documentação, roupas, aula de português, auxílio psicológico, direcionamento para emprego e apoio na fé. Também mantemos junto ao poder público um diálogo próximo em benefício dos estrangeiros”, concluiu.
Sugestão de leitura: Os novos rostos da imigração no Brasil. Haitianos no Rio Grande do Sul, escrito por Jurandir Zamberlam, Giovanni Corso, Lauro Bocchi e João Marcos Cimadon, publicado pelo Regional Sul 3 da CNBB, em 2014.
Sugestão de site: www.cibaimigracoes.com.br

* Judinei Vanzeto é Jornalista e assessor do Regional Sul 3 da CNBB. 
Fonte: POM

Nenhum comentário:

Postar um comentário