Dom Fernando Mason
Bispo de Piracicaba (SP)
Desta vez não falemos diretamente do Natal.
É que “Natal” é a celebração grata de uma presença que gera e rege uma comunidade chamada “Igreja” e, nela, rege inúmeras pessoas, chamadas cristãs. Isto é, concretamente o Natal se torna Igreja com sua história, se torna pessoas também e cada uma com sua história.
O que é a Igreja? Para ter acesso à estrutura interna da Igreja é bom partir daquilo que rezamos no Credo: creio na “santa” Igreja. Os santos da Igreja nos revelam a estrutura interna da própria Igreja.
Usualmente, quando dizemos ‘Igreja’ pensamos em um edifício ou em uma instituição. Esta concepção não percebe a extraordinária realidade, a dinâmica, as lutas, as derrotas, as vitórias da Igreja. Pois a Igreja é uma terrível aventura, humana e divina ao mesmo tempo. Um diálogo-aventura, um diálogo-risco, um encontro-diálogo entre Deus e homem, entre homem e Deus, através dos séculos.
A Igreja é a luta laboriosa, penosa e tenaz para que aconteça aquele encontro do qual o Natal é celebração. Nessa luta, dirige-se o chamado de Deus a cada indivíduo, aos povos, cada vez novo, diferente em cada época da história. Chamado que evoca, convoca, provoca, arrasta ao encontro com Ele.
Se pudéssemos intuir tudo a partir da interioridade humana, haveríamos de ver as lutas, os sofrimentos, a decadência, o pecado, a inquietação, a saudade, a dedicação, o amor, a esperança, nos quais, através dos quais, cada homem, cada comunidade, cada povo, sem descanso, se confronta com Deus, é por Ele chamado, atingido, impregnado e atraído.
Essa aventura, esse diálogo, esse encontro no qual Deus nos toma como parceiros, esta aventura do encontro entre Deus e homem, esta Vida: isto é a Igreja.
Mas se passarmos em revista a Vida da Igreja através da História, quanta miséria humana, quanta estreiteza, hipocrisia, mesquinhez, quanta coisa pecaminosa descobrimos ali!
Isto é então a Igreja santa de Deus, a Igreja de Jesus Cristo? Como resposta a Igreja apresenta os santos, isto é, as pessoas que foram perpassadas e transformadas pelo encontro com aquele cujo Natal sempre de novo celebramos. Apresenta os santos, mas não no triunfalismo orgulhoso e sim na humilde confissão da Misericórdia de Deus.
Os santos são a confissão da Igreja que reconhece humildemente a sua condição humana e proclama que somente Deus, que somente seu Amor, seu Poder tem a última palavra nessa aventura perigosa, mas fascinante de diálogo entre Deus e homem.
Se a Igreja canoniza um santo, então sabemos que nele a Boa Nova de Cristo se tornou a plenitude da vida, sem esquecer que a vida de cada santo, cada qual na sua singularidade, foi uma aventura humana, dura e perigosa, um salto corajoso no Mistério escondido.
Cada santo é um homem talvez fraco, limitado, avarento, covarde, violento. Cada santo é filho do seu povo, com todos os defeitos e todas as virtudes da sua raça, da sua nação. Cada santo é filho da sua época, impregnado de anelos, esperanças, angústias, inquietações e cegueiras da sua situação histórica. Este homem concreto é colocado diante da decisão de aceitar a luta apaixonada e apaixonante da busca de Deus, de entrar no diálogo de encontro com ele, de escorar e responder à sua provocação, na qual Deus com o seu Amor pronunciará a sua última palavra.
O santo não é santo apesar de suas fraquezas e seus pecados. Antes o é na sua fraqueza, na sua humanidade-abismo, porque ele, do fundo do seu ser, assumiu radicalmente a sua sorte, o seu destino humano; e é nessa sua situação única, nesta sua história que tentou viver a aventura do diálogo de encontro com Deus até o fim.
Que pelo Santo Natal de seu Filho Jesus o nosso Deus pronuncie a sua última Palavra de realização e plenitude sobre cada um: um Feliz e Santo Natal.
Fonte: CNBB
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