Publicado em 13 de agosto de 2012 por Blog Católica de Fortaleza
Almir Magalhães, sacerdote da Arquidiocese de Fortaleza, diretor geral e professor da Faculdade Católica de Fortaleza
A Teologia da Libertação (TdL) alcançou,
no ano passado, 40 anos de sua existência, se considerarmos como ato
teórico fundacional que deu nome ao movimento teológico mais importante
nascido na América o livro do teólogo peruano Gustavo Gutierrez,
intitulado Teologia da Libertação (Perspectivas), de 1971.
Esta Teologia sofreu críticas internas e
externas. Aceita por muitos, mal compreendida por outros, sofreu
distorções em torno de sua compreensão. Ela foi objeto de dois
documentos oriundos da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé: o
primeiro, em 6 agosto de 1984 intitulado Libertatis Nuntius, reflete
sobre alguns aspectos da TdL, considerado mais negativo e chamava a
atenção para os perigos de desvios prejudiciais à fé e à vida cristã,
sobretudo em relação ao corte marxista da mesma; o segundo, em 22/3/86,
intitulado Libertatis Conscientia, sobre a Liberdade Cristã e a
Libertação, considerado como de um tom mais positivo.
Este segundo documento foi objeto de
citação pelo papa João II numa carta aos bispos da CNBB datada de 9 de
abril de 1986, por ocasião do encerramento da Visita Ad Limina,
oportunidade em que o mesmo assim se expressou: “Na medida em que se
empenha por encontrar aquelas respostas justas – penetradas de
compreensão para com a rica experiência da Igreja neste País, tão
eficazes e construtivas quanto possível e ao mesmo tempo consonantes e
coerentes com os ensinamentos do Evangelho, da Tradição viva e do perene
Magistério da Igreja – estamos convencidos, nós e os senhores, de que a
Teologia da Libertação é não só oportuna mas útil e necessária. Ela
deve constituir uma nova etapa – em estreita conexão com as anteriores –
daquela reflexão teológica iniciada com a tradição apostólica e
continuada com os grandes padres e doutores, com o magistério ordinário e
extraordinário e, na época mais recente, com o rico patrimônio da
Doutrina Social da Igreja, expressa em documentos que vão da Rerum
Novarum à Laborem Exercens.
Dois aspectos continuam relevantes na TdL
e válidos para todos os cristãos: a práxis, ou seja, a TdL nos motiva
para uma prática, para uma concretude que se expressa em estar junto aos
que sofrem, em conhecer, participar, refletir e agir diante da vida dos
irmãos e da natureza; a mediação disso é a opção preferencial pelos
pobres. Com as transformações sociais estes tomaram novos rostos, mas
continua o referencial do empenho pela dignidade humana, pela defesa da
vida. Esta presença cristã, na fidelidade ao Evangelho, é gestadora de
esperança. Neste sentido, a TdL nos convida a uma ascese: mudar o perfil
de nossas práticas, restritas à vida íntima da Igreja, sair da
sacristia e ir ao encontro do próximo não para ensinar, fazer exigências
sacramentalistas, mas para partilhar, ser solidário.
O segundo elemento é de ordem
político-pedagógica: evitar o assistencialismo e a prática da caridade
reduzidas a cestas básicas, sopões e similares (a não ser em casos
emergenciais) e considerar o pobre como interlocutor, sujeito de sua
história, com motivações evangélicas, como cidadãos do mundo, com
deveres e direitos. Aqui o destaque é para o valor da dignidade humana. O
pobre não deve ser objeto de favores, de concessões, de medidas
compensatórias, mas pessoas capazes de construir, a partir da esperança,
um lugar, um bairro, uma sociedade diferentes.
Intriga-me sobremaneira as reações dos
agentes de pastoral (padres, leigos, bispos) sobre a TdL sem conhecê-la.
Constroem seus conceitos unicamente a partir de um patrimônio de
críticas que foram elaboradas e repetem-nas utilizando aquilo que
criticam, o ideológico.
Por isso faço um convite: conheçam a
TdL, leiam os dois documentos da Cúria Romana a respeito dela, conheçam o
pensamento social da Igreja, as Encíclicas Sociais… abram os horizontes
para além dos conceitos, das ideias e das chaves de leituras que
concordam. Assim o diálogo com o diferente pode tornar-se frutuoso. Nada
de fechamento.
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