sábado, 15 de setembro de 2012

Teologia da Libertação e esperança dos pobres


Almir Magalhães, sacerdote da Arquidiocese de Fortaleza, diretor geral e professor da Faculdade Católica de Fortaleza
A Teologia da Libertação (TdL) alcançou, no ano passado, 40 anos de sua existência, se considerarmos como ato teórico fundacional que deu nome ao movimento teológico mais importante nascido na América o livro do teólogo peruano Gustavo Gutierrez, intitulado Teologia da Libertação (Perspectivas), de 1971.
Esta Teologia sofreu críticas internas e externas. Aceita por muitos, mal compreendida por outros, sofreu distorções em torno de sua compreensão. Ela foi objeto de dois documentos oriundos da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé: o primeiro, em 6 agosto de 1984 intitulado Libertatis Nuntius, reflete sobre alguns aspectos da TdL, considerado mais negativo e chamava a atenção para os perigos de desvios prejudiciais à fé e à vida cristã, sobretudo em relação ao corte marxista da mesma; o segundo, em 22/3/86, intitulado Libertatis Conscientia, sobre a Liberdade Cristã e a Libertação, considerado como de um tom mais positivo.
Este segundo documento foi objeto de citação pelo papa João II numa carta aos bispos da CNBB datada de 9 de abril de 1986, por ocasião do encerramento da Visita Ad Limina, oportunidade em que o mesmo assim se expressou: “Na medida em que se empenha por encontrar aquelas respostas justas – penetradas de compreensão para com a rica experiência da Igreja neste País, tão eficazes e construtivas quanto possível e ao mesmo tempo consonantes e coerentes com os ensinamentos do Evangelho, da Tradição viva e do perene Magistério da Igreja – estamos convencidos, nós e os senhores, de que a Teologia da Libertação é não só oportuna mas útil e necessária. Ela deve constituir uma nova etapa – em estreita conexão com as anteriores – daquela reflexão teológica iniciada com a tradição apostólica e continuada com os grandes padres e doutores, com o magistério ordinário e extraordinário e, na época mais recente, com o rico patrimônio da Doutrina Social da Igreja, expressa em documentos que vão da Rerum Novarum à Laborem Exercens.
Dois aspectos continuam relevantes na TdL e válidos para todos os cristãos: a práxis, ou seja, a TdL nos motiva para uma prática, para uma concretude que se expressa em estar junto aos que sofrem, em conhecer, participar, refletir e agir diante da vida dos irmãos e da natureza; a mediação disso é a opção preferencial pelos pobres. Com as transformações sociais estes tomaram novos rostos, mas continua o referencial do empenho pela dignidade humana, pela defesa da vida. Esta presença cristã, na fidelidade ao Evangelho, é gestadora de esperança. Neste sentido, a TdL nos convida a uma ascese: mudar o perfil de nossas práticas, restritas à vida íntima da Igreja, sair da sacristia e ir ao encontro do próximo não para ensinar, fazer exigências sacramentalistas, mas para partilhar, ser solidário.
O segundo elemento é de ordem político-pedagógica: evitar o assistencialismo e a prática da caridade reduzidas a cestas básicas, sopões e similares (a não ser em casos emergenciais) e considerar o pobre como interlocutor, sujeito de sua história, com motivações evangélicas, como cidadãos do mundo, com deveres e direitos. Aqui o destaque é para o valor da dignidade humana. O pobre não deve ser objeto de favores, de concessões, de medidas compensatórias, mas pessoas capazes de construir, a partir da esperança, um lugar, um bairro, uma sociedade diferentes.
Intriga-me sobremaneira as reações dos agentes de pastoral (padres, leigos, bispos) sobre a TdL sem conhecê-la. Constroem seus conceitos unicamente a partir de um patrimônio de críticas que foram elaboradas e repetem-nas utilizando aquilo que criticam, o ideológico.
 Por isso faço um convite: conheçam a TdL, leiam os dois documentos da Cúria Romana a respeito dela, conheçam o pensamento social da Igreja, as Encíclicas Sociais… abram os horizontes para além dos conceitos, das ideias e das chaves de leituras que concordam. Assim o diálogo com o diferente pode tornar-se frutuoso. Nada de fechamento.

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