Uma
das páginas mais comoventes do livro das Confissões de Santo Agostinho é
a oração que dirige a Deus, com um misto de alegria e de dor, ao
lembrar-se das hesitações e as demoras que atrasaram a sua conversão:
«Tarde te amei, ó beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei! Tu
estavas dentro de mim e eu te procurava fora: lançava-me transtornado
sobre as belezas que tu criaste. Tu estavas comigo, e eu não estava
contigo. Seguravam-me longe de ti as coisas criadas que, se não fossem
sustentadas por ti, nem mesmo existiriam. Chamaste, clamaste e rompeste a
minha surdez; brilhaste, resplandeceste, e a tua luz afugentou a minha
cegueira; exalaste o teu perfume e respirei, suspirei por ti;
saboreei-te, e agora tenho fome e sede de ti; Tu me tocaste, e agora
estou ardendo no desejo da tua paz» (liv. 10, 27).
Santo Agostinho sentiu, desde muito jovem, uma sede ardente de
felicidade, de amor, de verdade. Percorreu aos trambolhões um longo
caminho de procura. Foi sincero. Por isso Deus ouviu as suas súplicas e
lhe deu a resposta, acendendo-lhe na alma a luz da fé em Cristo. A
partir desse instante, foi invadido por uma alegria que nunca mais iria
abandoná-lo.
«Senhor…, fizeste-nos para ti e o nosso coração estará inquieto
enquanto não descansar em ti», escrevia no começo das suas Confissões.
Descansou na fé e no amor. Essa foi a sua experiência.
Alegria! Paz! Todos nós as desejamos… e como nos custa encontrá-las.
Continuam a ser para nós um tesouro escondido (cf. Mt 13, 44). E, no
entanto, poderíamos achá-las se nos puséssemos em condições de alcançar a
graça da fé. Não o incentiva pensar que a Bíblia, o Novo Testamento,
nos mostra que a alegria autêntica é inseparável da fé?
Lembre. Jesus acabava de nascer e já houve uns homens, os Magos, que,
acolhendo com fé o sinal profético de uma estrela, empreenderam um
duro caminho. São Mateus conta assim o final dessa aventura: E eis que a
estrela, que tinham visto no oriente, os foi precedendo até chegar
sobre o lugar onde estava o menino e ali parou. Ao verem a estrela – ao
acharem Jesus –, sentiram uma imensa alegria (Mt 2,9-10). O tamanho
dessa alegria deduz-se do texto original do Evangelho, que é difícil
reproduzir com exatidão: Alegraram-se com uma alegria muito grande, e
muito! Uma explosão de alegria no coração.
Lembremos também outro relato do Novo Testamento. A comunidade cristã
acabava de nascer e já sofria perseguição. Como é que viviam a fé? São
Pedro o conta: Este Jesus vós o amais sem o terdes visto; credes nele
sem o verdes ainda, e isto é para vós a fonte de uma alegria inefável e
gloriosa, porque estais certos de obter, como preço da vossa fé, a
salvação de vossas almas (1 Ped 1,8-9).
Os testemunhos sobre a alegria da fé são inúmeros. Quero trazer agora
apenas um de tempo relativamente recente, o do jornalista André
Frossard. Era filho do primeiro Secretário geral do Partido Comunista
francês, e foi criado totalmente à margem da religião. Entrou um dia por
acaso numa igreja, ponto de espera marcado por um amigo. De repente,
instantaneamente, Deus o atingiu com a sua graça, e passou a crer sem
nenhuma dúvida, a crer em “todas” as verdades da fé católica. Foi um
milagre do amor de Deus, que jamais esqueceria. Assim o comentava
posteriormente: «Como esquecer o dia em que, numa capela subitamente
rasgada de luz, se descobre o amor ignorado pelo qual se ama e se
respira, em que se aprende que o homem não está só, que uma presença
invisível o penetra, o rodeia e o espera, que para lá dos sentidos e da
imaginação existe um outro mundo, em comparação com o qual este universo
material, por mais belo que seja e por mais atrativo que se apresente,
não passa de vaga neblina e reflexo distante da beleza que o criou» (Há
um outro mundo, Quadrante 2003).
Como já sabe, estamos no Ano da Fé, proclamado pelo Papa Bento XVI em
11 de outubro de 2011, com a Carta Apostólica Porta fidei (“A porta da
pé”), comemorando os 50 anos do início do Concílio Vaticano II e 20 anos
da publicação do Catecismo da Igreja Católica. Vai terminar na
Solenidade de Cristo Rei, 24 de novembro de 2013. A carta Porta fidei
incentiva-nos a desejar ter ou aumentar a nossa fé. Fala da «necessidade
de redescobrir o caminho da fé, para fazer brilhar, com evidência
sempre maior, a alegria e o renovado entusiasmo do encontro com Cristo»
(n. 2).
Na audiência da quarta-feira 10 de outubro de 2012, véspera do início
deste Ano da Fé, o Papa voltou a exortar-nos a «redescobrir cada dia a
beleza da nossa fé». No dia seguinte, inaugurando o Ano da Fé, voltava a
referir-se em uma homilia à «alegria de crer e à sua importância vital
para nós, homens e mulheres». E, poucos dias depois, na audiência da
quarta-feira 17 de outubro, anunciou o seu propósito de dedicar, neste
Ano da Fé, as alocuções das quartas-feiras à catequese sobre o tema da
fé: «Quereria – dizia –que fizéssemos um caminho para reforçar ou
reencontrar a alegria da fé, compreendendo que a fé não é algo alheio,
separado da vida concreta, mas é a sua alma». Não deixe de ler, se
puder, essas catequeses de Bento XVI, que pode encontrar no site www.vatican.va [em “Ano da fé” ou “Audiências”], e no site noticias.cancaonova.com, entre outros.
Na Carta Porta fidei o Papa faz um resumo sintético das finalidades
dste ano: «Descobrir novamente os conteúdos da fé professada (as
verdades da fé), da fé celebrada (nos Sacramentos), da fé vivida (na
conduta, na vida real, na vida moral), e da fé rezada (da oração e da
vida de oração)» (Porta fidei, n. 9).
Se você conhece o Catecismo da Igreja Católica, deve ter observado
que, em poucas palavras, o Papa menciona as quatro partes em que o
Catecismo se divide: I. A profissão da fé; II. A celebração do mistério
cristão; III. A vida em Cristo; IV. A oração cristã.
É natural, pois, que a Carta Porta fidei insista em que «o Ano da Fé
deverá exprimir um esforço generalizado em prol da redescoberta e do
estudo dos conteúdos fundamentais da fé, que têm no Catecismo da Igreja
Católica a sua síntese sistemática e orgânica [...]. Na sua própria
estrutura, o Catecismo da Igreja Católica apresenta o desenvolvimento da
fé até chegar aos grandes temas da vida diária» (n. 11).
Todos somos conclamados, portanto, a estudar e a difundir o conteúdo –
assimilado, esmiuçado, traduzido em linguagem acessível – do Catecismo
da Igreja e do seu Compêndio, bem como a redescobrir os documentos do
Concílio Vaticano II.
Deixe-me acabar esse trecho com uma pergunta: Você vai fazer alguma
coisa? O que poderia fazer para aprofundar e dar a conhecer a “doutrina”
católica, os “conteúdos” da fé?
Por Padre Francisco Faus
Fonte: cancaonova
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