Por
ocasião dos 60 anos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), celebrados em outubro de 2012, a direção das Pontifícias Obras
Missionárias (POM) colaborou com esse artigo que resgata a história da
instituição episcopal no panorama da dimensão missionária realçada com o
Concílio Vaticano II. Confira, abaixo.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) nasceu no dia 14 de Outubro de 1952. O território nacional com extensão continental, as comunicações precárias, quando não ausentes, o número de Arquidioceses, Dioceses e Prelazias (117 ao todo) foram fatores decisivos para a criação desse organismo que, em 1952, só existia na França, Alemanha e Estados Unidos.
O Pentecostes da CNBB
Antes
de completar dez anos de vida, a CNBB foi abençoada com um poderoso
Pentecostes. No dia 25 de janeiro de 1961 o papa João XXIII chamou a
Roma todos os bispos católicos do mundo para, com eles, estudar os
grandes problemas da humanidade e, possivelmente, encaminhar sua
solução.
Nos
quatro anos seguintes, os nossos padres conciliares brasileiros foram
submetidos, três meses por ano, a um exigente noviciado: de manhã
sentados lado a lado com os bispos do mundo inteiro, na Basílica de São
Pedro, discutindo os temas propostos; de tarde na “Domus Mariae”
escutando os pensadores mais conceituados para enriquecer e atualizar
seus conhecimentos. Uma reciclagem e tanto.
O melhor fruto do Concílio
Os
frutos deste ingente trabalho foram quatro Constituições, nove Decretos
e três Declarações. Mas o Concílio produziu um fruto muito mais
precioso. No dia 11 de outubro de 1962, Roma recebeu 2.381 bispos
isolados e mutuamente desconhecidos. No dia 8 de dezembro de 1965, a
basílica de São Pedro devolveu ao mundo 2.386 bispos afinados,
conhecedores da realidade mundial, sensíveis e abertos aos problemas da
Igreja toda.
Antes
de sair de Roma, no final do Concílio, os bispos do Brasil realizam sua
IX Assembleia Geral, na qual foi elaborado o primeiro Plano de Pastoral
de Conjunto (PPC) organizado em seis linhas de ação, fundamentadas nos
documentos do Concílio Vaticano II. Uma dessas “linhas”, a segunda,
define o compromisso do episcopado brasileiro com a missão universal da
Igreja enunciada novamente pelo Concílio.
“Dentro do País e fora dele”
As
Diretrizes Gerais da Ação Pastoral da Igreja do Brasil (rebatizadas, a
partir de 1995, por Diretrizes Gerais da Ação evangelizadora da Igreja
do Brasil) e os Planos Bienais, retocados mais ou menos nas Assembleias
anuais dos Bispos, disseram coisas gloriosas sobre a importância, a
urgência, a conveniência do compromisso missionário ad gentes.
- Devemos "dar de nossa pobreza" projetando-nos ad gentes, além de nossas fronteiras (P 368). (DGAP 1978-82)
- Esta "tarefa especificamente missionária, (missão” ad gentes) que Jesus confiou e continua cotidianamente a confiar à sua Igreja, não se deve tornar uma realidade diluída na missão global de todo o povo de Deus, ficando desse modo descurada ou esquecida". (DGAP 1991-94)
- Esta "tarefa especificamente missionária, (missão” ad gentes) que Jesus confiou e continua cotidianamente a confiar à sua Igreja, não se deve tornar uma realidade diluída na missão global de todo o povo de Deus, ficando desse modo descurada ou esquecida". (DGAP 1991-94)
-
“Uma Igreja local não pode esperar atingir a plena maturidade eclesial
e, só então, começar a preocupar-se com a missão para além de seu
território. A maturidade eclesial é conseqüência e não apenas condição
de abertura missionária. Estaria condenando-se à esterilidade a Igreja
que deixasse atrofiado seu espírito missionário, sob a alegação de que
ainda não foram plenamente atendidas todas as necessidades locais (119).
(Igreja: comunhão e missão na evangelização dos povos, no mundo do
trabalho, da política e da cultura - Doc. 40 da CNBB).
Uma avaliação insuspeita
O que foi feito de tão generosos compromissos? A resposta encontramos nas páginas do Comunicado Mensal, órgão oficial da CNBB.
Na
XIII Assembleia Geral da CNBB (S. Paulo, 06-15.02.1973) Dom Mário
Gurgel, bispo encarregado da Linha II (Dimensão Missionária) apresentou
um relatório sobre aquela que ele chamou de “desconcertante deficiência
de espírito missionário” no Brasil.
O
documento afirma: “Herança talvez de uma cômoda dependência espiritual
de nossos irmãos missionários de outras terras e de um cristianismo
egoísta do «salva a tua alma», o que é certo é que essa apatia tem
conseqüências desastrosas na Igreja do Brasil, que vão desde o
raquitismo à ausência do senso de co-responsabilidade no interior de
nossas comunidades, bem como o desinteresse pelos nossos territórios de
missão e pelas necessidades da Igreja Universal”.
Concretizando
o diagnóstico, o bispo afirma: “Poderíamos apontar entre as
dificuldades para sanar essa falta do espírito missionário deficiências
estruturais tanto da própria CNBB como das Obras Pontifícias
Missionárias e falta de um relacionamento necessário entre as duas.
Relativamente à CNBB, o Plano de Pastoral de Conjunto previa que à Linha
2 caberia a ação missionária, na qual ‘devem empenhar-se todos os
membros do povo de Deus, cada um segundo sua vocação e função na Igreja”
(Plano de Pastoral de Conjunto, p. 90). No entanto, quando a cada linha
correspondia um ou mais Secretariados responsáveis por vários projetos
nos quatro programas, à Linha 2 cabia o Secretariado Nacional de
Prelazias que, pelo próprio nome, era mais um serviço às mesmas do que
um órgão dinamizador da ação missionária. Tanto isso é verdade que os
projetos da Linha 2 foram entregues ao Secretariado Geral (2.8) ou ao
Secretariado Nacional de Catequese (3.2)”.
“As
Pontifícias Obras Missionárias (POM), por sua vez - sem se desconhecer o
auxílio financeiro em prol das missões - pouco ajudaram ao
desenvolvimento do espírito missionário de nossos fiéis de vez que
colocavam todo a ênfase na arrecadação de auxílios, inclusive com
métodos e critérios pouco formativos”.
“Mas
o que impedia verdadeiramente uma ação mais eficiente e a correção das
falhas citadas, era a falta de uma coordenação de esforços. A
interpretação de seu caráter de pontifícias como isenção de qualquer
entrave fez com que, de um lado elas se esquivassem a uma orientação
pastoral e de outro, os bispos se desinteressassem pelas mesmas,
julgando, por vezes, indesejáveis suas campanhas nas dioceses”.
“Foi
tendo em vista a solução desse impasse, de consequências pastorais
muito mais sérias do que parecem à primeira vista, que se decidiu a
criação do Conselho Missionário Nacional (COMINA), conforme pede o Moto
Próprio Ecclesiae Sanctae (III, 11)”.
“A
proposta feita pelo bispo responsável pela Linha 2 em reunião dos
Superiores Religiosos Missionários promovida pela Obra Pontifícia da
Propagação da Fé (S. Paulo, agosto 1972) foi imediatamente acolhida”.
(Ver Comunicado Mensal, n. 245, fevereiro de 1973, pp. 362-364).
Poucos meses depois as POM se pronunciam:
Estamos
convencidos de que "a Igreja é, por sua natureza, missionária". A
consciência desta sua missionariedade aprofunda-se cada dia mais.
Entretanto, damos a esta missionariedade um sentido muitas vezes
incompleto e até ambíguo... As igrejas locais estabelecidas não podem
limitar a sua missionariedade à atividade evangelizadora dos que
convivem na mesma comunidade e estão longe do Cristo ou da vivência do
cristianismo.
É
verdade que a Missão é também aqui, mas não é verdade que seja somente
aqui. Igualmente é verdade que devemos irradiar a evangelização ao nosso
redor, no lugar em que vivemos e moramos, mas não é verdade que a
missionariedade (seja de cada cristão como de cada comunidade eclesial)
se esgota nisto. A Igreja vive e cresce e se torna adulta na medida e
que se abre à conversão do mundo...
Devemos
confessar que nem sempre sentimos e vivemos esta dimensão da
missionariedade. A Igreja no Brasil está fazendo grandes esforços para
se tornar missionária, mas só internamente.
Esta
dimensão interna da sua missionariedade é urgente e necessária, mas é
insuficiente, se não é completada pela dimensão universal, católica. É
preciso então, que a Igreja no Brasil se comprometa com a animação
missionária no sentido universal, assim como se compromete com a
dimensão missionária local... (CNBB - Comunicado Mensal, julho de 1973,
pp.956-957).
A
partir da criação do COMINA, que passou a articular e coordenar a
dimensão missionária no Brasil houve maior harmonia entre as várias
forças (POM, CNBB e CRB) engajadas nessa atividade. Uma das prioridades
continua sendo a formação através de encontros, congressos e outras
atividades nas dioceses e regionais, de maneira especial os cursos
realizados no Centro Cultural Missionário (CCM). Esse dinamismo
representa uma grande riqueza no esforço de evidenciar a verdadeira
natureza e identidade missionária da nossa Igreja. A celebração dos
sessenta anos da CNBB é uma boa ocasião para avaliar a caminhada feita,
evidenciando serenamente acertos e desencontros. Afinal, a missão
recebida de Jesus é maior que qualquer um de nós e o julgamento se fará a
partir dos frutos produzidos (Mt 7,20).Fonte: POM
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