Carlos
e Regina estavam eufóricos. Iriam, enfim, realizar o sonho que os
acompanhava nos últimos anos. A igreja para o casamento tinha sido
escolhida com carinho; os convites foram distribuídos a tempo e toda a
festa estava preparada nos mínimos detalhes. Não faltaram as
brincadeiras dos amigos: “Até que enfim! Até que enfim!...” Sentiam que
valera a pena terem namorado durante alguns anos, como também guardavam
belas recordações dos meses de noivado. Podiam dizer que se conheciam
bem. Diante do que era essencial, estavam plenamente de acordo. Só
faltava mesmo dizerem mutuamente o “sim” diante de Deus e dos homens.
O “sim” – “Eu te recebo e te prometo ser fiel, amar-te e respeitar-te
na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, todos os dias da nossa
vida” – foi dito com alegria. Ela estava trêmula, emocionada. Sua voz
mal saiu. Ele estava mais sério do que de costume. Ali, diante do altar,
até se lembrou da primeira vez que, logo que começou a estudar, foi
obrigado a recitar uma poesia diante dos colegas: todo mundo estava
olhando para ele e a poesia não saía. Parecia que alguém tapava sua
boca...
Agora, no momento dos cumprimentos, os noivos perceberam a
sinceridade dos amigos que lhes desejavam felicidades. Haveria, no
mundo, um casal mais feliz? A vida abria um largo sorriso para eles.
Eles, por sua vez, olhavam para o futuro com confiança e alegria.
Vinte anos depois do casamento, custava ao sacerdote se convencer do
que ouvia. Não tivesse motivos suficientes para acreditar em Luís
Antônio, filho de Carlos e Regina, poderia achar que estivesse
exagerando. Fora o jovem que, livremente, o procurara. Ouvindo-o, era
difícil se convencer de que aquele jovem tivesse somente 18 anos. Em
alguns momentos, o sacerdote tinha a impressão de estar diante de alguém
que já tivesse vivido uns 40 ou 50 anos. Era-lhe doloroso ouvir uma
história marcada por tanta dor e solidão. Nada faltava ao jovem: tinha
bela casa, frequentava a faculdade e, para seu próximo aniversário, os
pais haviam prometido um presente especial. Mas o jovem dizia não ser
feliz.
Seu pai, ocupado demais com os negócios, não tinha tempo nem para
ele, Luís Antônio, nem para os outros filhos. Levava uma vida agitada,
cheia de compromissos, mas certo de que trabalhava para a família,
unicamente para o bem dos filhos. Afinal, dava-lhes o necessário e tudo o
que podia. Estava convicto de que eles não tinham nada de que reclamar.
Sua mãe tinha a certeza de que era a melhor mãe do mundo. Porém, de
tão ocupada, não percebia que, na verdade, pouco conhecia da vida deles,
dos amigos que tinham e das preocupações dos filhos. Nem se lembrava da
última conversa mais profunda que tivera com eles. Conhecia, tão
somente, uma série de fatos, fruto das conversas nas refeições.
Luís Antônio não se sentia amado: esse era o seu drama. O drama de
seus pais era outro: conscientes de serem os melhores pais do mundo, não
compreendiam por que o filho os agredia tanto. Como não eram capazes de
se colocar no lugar do filho, não conseguiam avaliar sua solidão.
Também não percebiam que a educação que davam aos filhos sofria uma
concorrência imensa: concorria com as idéias dos meios de comunicação
social, dos professores, dos colegas; do mundo todo, enfim. Não poucas
vezes, havia oposição total entre tais ideias. Luís Antônio,
desorientado, precisava urgentemente da atenção, da presença e do amor
dos pais. No momento, essa era a única linguagem que poderia atingi-lo, a
única que entenderia. No entanto, ilhados em seus próprios problemas e
assoberbados por inúmeras tarefas e preocupações, os pais não viam as
barreias que os distanciavam do filho.
Onde, afinal, ficaram os sonhos de vinte anos atrás? Em que lugar do
mundo foram enterradas aquelas frases do noivado: “Carlos, vamos viver
só para nossos filhos!” e “Regina, nosso lar será o melhor do mundo!
Vamos transmitir a nossos filhos todo o amor que há em nós!...”?
Que estranha vida é essa que deforma e destrói tantos sonhos?...
Por Dom Murilo S. R. Krieger,scj
Fonte: bethania
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